Conheci, por meio das redes sociais, uma das iniciativas da equipe de cuidados paliativos do Hospital Universitário Walter Cantídio, de Fortaleza, onde é oferecido tratamento pelo SUS a pacientes com diagnósticos de doenças graves. Esse programa é coordenado pela médica Cinara Franco, geriatra e paliativista. Sempre que possível, ela e sua equipe se mobilizam para atender aos pedidos especiais dos pacientes sem qualquer possibilidade de cura. Dessa vez, o grupo tornou possível o desejo da Izabel Loiola, 48 anos, internada com leucemia. Seu corpo já não responde às quimioterapias. Isso impossibilita o recebimento de um transplante de medula óssea. Izabel desejava se reencontrar com o mar. Esse reencontro ocorreu recentemente na praia de Iracema. Foi marcado pela presença da sua família: pai, mãe, irmãos e primas. “Todas as minhas memórias da praia são maravilhosas. O mar sempre me dá paz e harmonia. Reencontrar a minha família, ainda mais na praia, foi uma das melhores coisas que me aconteceu na vida”. Algo que deveria ser comum na rotina dos hospitais que tratam de pacientes terminais, ganha visibilidade na imprensa por ser ainda da ordem da exceção.
Há profissionais da área da saúde que, diante da impossibilidade de cura, “saem da arena, derrotados e impotentes (…) se eles soubessem que sua missão é cuidar da vida, e que a morte, tanto quanto o nascimento, é parte da vida, eles ficariam até o fim. E, assim, ficariam também um pouco mais sábios” (Rubem Alves). Quando não obtêm o ‘sucesso’ da cura, e a morte se torna próxima, é corriqueiro não terem o que fazer e o que dizer, pois pouco sabem sobre a finitude humana e a morte de si e dos outros. A negação da morte, travestida pelo discurso de uma prática médica onipotente, é uma tentativa – sempre fracassada – de tamponar o furo que ela aponta.
Freud, no texto “Nossa atitude perante a morte, de 1915, já pontuava que “a morte é o desfecho necessário de toda vida (…) é incontestável e inevitável (…) a tendência de excluir a morte dos cálculos da vida traz consigo muitas outras renúncias e exclusões (…) Não seria melhor dar à morte o lugar que lhe cabe, na realidade e em nossos pensamentos, e pôr um pouco mais à mostra nossa atitude inconsciente ante a morte, que até agora reprimimos cuidadosamente?”.
Que a criação de programas de cuidados paliativos seja um caminho sem volta. E que casos como da Izabel não sejam tratados pelo viés da exceção.
Clovis Pinto de Castro