“(…) ao se indagar sobre as formas da vida social, a psicanálise procurou sobretudo descrever os regimes de adesão à sujeição social, ou seja, a essa maneira de associar a própria instauração da vida psíquica, a constituição de suas instâncias a modalidades de adesão ao que nos faz sofrer. Pois a sujeição não poderia se dar apenas através de coerção, da violência direta, embora ela não deixe de apelar a tais expedientes, se necessário for. Há processos identificatórios, demandas de amor, expectativas de amparo, ou seja, há todo um circuito de afetos, com seus medos, esperanças, melancolias, que sustenta o poder, que dá ao poder a força de sujeitar sujeitos, de gerir suas expectativas e sofrimentos, e é desse circuito que a psicanálise fala. Nós paradoxalmente amamos aquilo que nos sujeita, e não seria de outra forma que tal sujeição conservaria a sua força. Por essa razão, a psicanálise logo se consolidou como uma referência maior na análise de fenômenos de regressão social, em especial do fascismo”.
Vladimir Satafle, “Maneiras de transformar mundos – Lacan, política e emancipação, Autêntica, 2020.